Funk-fique-se

Ser um artista independente não é fácil: há os perrengues de lançar o primeiro disco, de montar os shows e da divulgação do trabalho. O caminho não é dos mais fáceis – “É uma luta”, diz Rafael Moura de Cunha, vocalista da banda de soul e funk Black Papa.

Porém ele continua, sorrindo: “É incrível [ser um artista independente], eu amo. Eu fui advogado por dez anos da minha vida e eu larguei tudo sem ter grana. Não tinha grana nenhum, mas eu estava cansado de fazer aquilo que o sistema quer que você faça. Então vem muito do coração”, continuou. “Se a pessoa tem vontade de fazer de verdade, se é aquilo que ela tem vontade de falar, se é o que ela tem paixão, ela deve fazer. Só que é um trabalho como qualquer outro, você vai ter que acordar cedo, estudar, ir procurar show, ir falar com não sei quem, vender disco, etc. É um trabalhão, às vezes você fica até a madrugada fazendo música nova, vendo palco. É um trabalho como qualquer outro. É possível. Mas essa história de dar dinheiro… nenhuma carreira tem essa. Você tem que trabalhar e gostar. ”

E como ele sempre gostou de música e ouviu muito funk, Rafael não pensou duas vezes quando se uniu com Marcelo Povo e formou a banda, em 2013. Marcelo é um mestrando que estuda o baile black no Rio de Janeiro, a noite do shaft, a qual era proporcionava o orgulho negro nos anos 70. Unindo as duas coisas, eles decidiram fazer uma banda que resgatasse a ideia do orgulho black, da música black, mas de um modo mais geral: “Porque a gente não tem a menor intenção de protagonizar um movimento que a gente não tem como protagonizar. A gente respeita. ”

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Composta por Rafael no vocal, Raphael Bechelli na guitarra, Enrico Manzano no piano e teclado, Ralf Jenger no baixo elétrico, Jorge Soul na bateria, Sérgio Luiz Bazzanelli Fliho na percussão, Eudes dos Santos no trombone, Chico Toledo no trompete e Marcel Enderle no saxofone, a banda Black Papa traz o melhor do funk em músicas dançantes em seu EP Suor. Lançado nesse ano por meio de financiamento coletivo. Utilizando o site Partio, que é uma plataforma de crowdfounding exatamente para projetos culturais, a banda recebeu apoio dos fãs e amigos e deu o ponta pé inicial para a carreira.

Suor apresenta críticas sociais, colocando em pauta a desigualdade na sociedade brasileira e contestando atos de violência feitos em nome da fé ou em nome do dinheiro, como em Em Nome de Deus. Baseando-se em protestos, a banda pede por justiça em Não Vamos Nos Calar. Já a faixa Funk Baião traz uma releitura de Lampião e Maria Bonita, mostrando-os como heróis do nordeste brasileiro. O EP enaltece a troca de energias e a expressão delas através da dança, o que resulta no suor; coisa que Black Papa também faz em seu show ao vivo na Avenida Paulista, no dia 9 de outubro, chamando todos os presentes para dançar de seus próprios jeitos, sem se ater às convenções sociais.

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Na segunda vez em que a banda se apresenta na Paulista, os músicos seguem energéticos e animados no dia de sol que se estende sob São Paulo. Com os equipamentos montados na calçada, a banda se posta como se estivesse em cima de um palco de frente para a rua, a qual vai se amontoando de pessoas que, curiosas, foram atraídas até o som animado que os chamava desde a saída da estação de metrô.

Escrito com giz no chão, na beira da calçada, o nome da banda se presta de frente para o espaço que o público deixou, o qual logo se tornou uma pista de dança para os mais corajosos. Durante o show, eles jogavam as mãos para o alto, sorrindo e sempre trazendo a energia do funk como libertadora, como um modo de amor e felicidade se manifestarem através dos corpos presentes. “O nosso show não é um show agressivo, ele é um show de celebração. A paulista ajuda a poder divulgar a cultura da música brasileira, que somos nós, ao invés de só ouvir a rádio. Paulista aberta, sensacional. ”

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A Avenida Paulista, quando aberta para o público, se torna um grande espaço de lazer que permite para outros músicos se apresentarem e divulgarem seu trabalho para pessoas que talvez não os conheçam. “[A Paulista é um espaço] onde elas podem celebrar, onde elas podem ver uma banda gratuitamente. Uma banda que infelizmente as casas de show só acontecem a noite, as vezes quando acontece um SESC a gente tem a oportunidade de tocar para uma criança”, disse Rafael, ao lado de um pequeno fã que depositava uma nota de cinco reais em uma caixa na frente dos instrumentos, a qual recebia tanto doações quanto um modo de apreço por aqueles que gostaram do show.

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Mesmo com a agenda quinzenal e planos para tocar em outros estados já no próximo mês, a banda “continua fazendo shows como esse, por exemplo, que o dinheiro não vai para ninguém da gente, nós guardamos para a banda exatamente para pagar ensaio, fazer disco. Então sempre tem um show que a gente faz para banda continuar caminhando.

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